No última segunda-feira (19), o site Radar014 publicou uma matéria com o título sensacionalista: “Descontrolada, mulher ataca funcionária pública em posto de saúde”. O vídeo que acompanha a publicação mostra uma discussão entre duas mulheres em uma unidade de saúde de Pompeia. O problema? A narrativa escolhida pelo portal ignora o boletim de ocorrência registrado pela verdadeira vítima, Cláudia Rocha, e distorce os fatos em benefício de uma servidora pública municipal.
Segundo a ocorrência, Cláudia esteve na Unidade de Saúde Flávio Faria Jordão para realizar exames. Ao sair do local, foi provocada por Andrelina de Oliveira Martins, servidora da Prefeitura, com quem já havia desavenças anteriores. O vídeo, apresentado na íntegra, mostra que Cláudia já havia passado pela servidora, quando Andrelina deliberadamente vira o rosto em sua direção, profere palavras inaudíveis e faz expressões faciais provocativas. Em seguida, saca um celular e começa a filmar Cláudia, gerando constrangimento e acirrando a tensão.
Apesar da gravação completa, a matéria do Radar014 omite esse início, e direciona a narrativa para fazer parecer que Cláudia foi quem iniciou o confronto. O texto afirma que ela “avançou” contra uma funcionária, que “precisou ser contida” e que foi vista “aos gritos” em via pública — como se isso bastasse para definir sua culpa, sem qualquer menção à provocação que sofreu ou à sua versão dos fatos.
A origem das imagens: um problema ainda maior
Há outro ponto que não pode passar despercebido: as imagens de segurança foram cedidas pelo Departamento de Higiene e Saúde da Prefeitura de Pompeia à Polícia Civil, a pedido da própria Andrelina. A partir daí, o material passou a circular em grupos de WhatsApp e foi publicado pelo site, sem qualquer autorização da pessoa exposta — o que pode configurar violação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e uso indevido de material público para fins de exposição pessoal.
Três entes tinham acesso às imagens: o próprio Departamento, a Polícia e a servidora. A pergunta que precisa ser feita é: como um vídeo protegido por sigilo foi parar em um site de notícias com narrativa distorcida?
Quando a imprensa não informa — ataca
Além da matéria parcial, um comentário feito pelo cidadão Daniel Baldacini agrava ainda mais a situação. Ao se manifestar, afirmou que Cláudia seria “um fantoche usado para atacar pessoas”. A fala, sem qualquer prova ou responsabilidade, é um ataque direto à dignidade da cidadã, com insinuações políticas e desprezo pelos fatos reais.
Esse tipo de julgamento público, baseado em versões unilaterais, transforma o jornalismo em tribunal, e o cidadão comum em alvo. Informação não pode ser usada para perseguir ou humilhar. Muito menos quando envolve servidores públicos e o uso de estruturas institucionais para fins pessoais.

O que está em jogo não é só a imagem de Cláudia
O caso de Cláudia Rocha não diz respeito apenas a uma discussão pessoal. Ele expõe como o uso seletivo da imprensa, a circulação indevida de imagens e o acesso privilegiado a órgãos públicos podem ser usados para construir narrativas — e destruir reputações.
Pompeia precisa de informação, não de linchamento.
Não há politicagem. Há jornalismo.
E jornalismo exige responsabilidade.